20 de junho de 2012

VITAL CORRÊA NA FAMASUL


Vital Corrêa de Araújo
              O poeta Vital Corrêa de Araújo esteve na FAMASUL no dia 5 de junho/2012, falando de sua poética. Veja a repercussão da passagem deste grande escritor nos depoimentos de professores e universitários.  



PESCARIA COM VITAL CORRÊA DE ARAÚJO

Admmauro Gommes,
poeta e professor de Teoria Literária da FAMASUL (Palmares-PE)
       
Nos primeiros momentos em que tive contato com a poesia de Vital Corrêa de Araújo, a imagem que logo me ocorreu foi a que quando eu era ainda criança, acompanhei meu tio em uma pescaria. O filme repassou completo em minha mente, durante a leitura de seus textos. O meu tio pescava em uma parte do pequeno rio que fazia uma cachoeira de aproximadamente um metro e meio. No desaguar do riacho, os peixes entravam em atrito com as pedras mais profundas, pulavam e saíam das águas como se tivessem fazendo acrobacias, e voavam. Cada um me surpreendia porque eu não tinha ideia de que parte do rio eles apareciam. Esta mesma cena me surgiu ao ler os poemas de Vital. Parece que as palavras deste poeta, quando entram em atrito com a folha d’água do livro, sobressaem e nos surpreendem, aos pulos, enigmáticas.
Às vezes, não dava para descobrir a espécie que saía das águas, na época do meu tio. Assim, como em um rápido olhar, quase não decifro o sentido metafórico da palavra vitalina. Aliás, como ele mesmo propõe, "o poema é algo trisambíguo", pois vai além da ambiguidade que já é polissêmica, na mais simples expressão. É que os peixes saem das páginas dos poemas de Vital, como as metáforas voavam no riacho. Eu não sei por que essas imagens se confundem. Talvez elas me comuniquem algo ligado ao doce da infância, ao vazio indizível, perceptível apenas nas linhas do texto e do anzol, como quem brinca com peixes ou pesca palavras.
Para mim, a poética de Vital triunfa emblemática, pois eu não sabia de onde vinham os peixes que se renovavam, também não decifrei como nascem as combinações inusitadas em Vital Correia. A cada palavra é um peixe diferente, conotações inauditas que nos levam a contemplar a correnteza caudalosa de seus versos. O mais interessante é que o rio não se esgota, é que a efervescência das letras não encontra um fim, quando continuam reinventando a vida, o desejo de interpretar o espetacular conflito do homem com ele mesmo.
Como aqueles voos cegos de pássaros/peixes que duravam fração de segundos para que saíssem da água e para ela voltassem, os textos de Vital também são assim. Apenas um breve olhar já é suficiente para que a mente fotografe as águas do livro, ou a página do rio. As imagens tanto da minha infância quanto as de agora, pela ótica desse poeta, mesmo sendo em rápida observação, permanecerão por muito tempo em minhas retinas, fruto de algo sempre novo, saindo do velho rio, contudo indecifrável como é a essência do próprio ser, nessa pescaria sem fim, que é a vida.

Vital Corrêa, Admmauro Gommes e o Professor Orlando, na Biblioteca da FAMASUL


UM POEMA DE VITAL CORRÊA DE ARAÚJO
(do livro Ora pro nobis scania vabis)

5.5

Baías se afogam no próprio estrato
musgos se engasgam com feldspatos
bombas bebem sais de nitrato
perfumes endeusam o átimo das narinas
antros prismáticos de obscuros aromas
cicatrizes de estrelas, betumes solares
escuras feridas iluminam
maestros encarcerados
à luz de violoncelos e guitarras ígneas
procuram a saída
tocam a fuga
violam sinfonias
que títeres anunciam à beira de suas piras.
O sangue inacabado das semifusas
grito das pautas, o que o id salmodia
e a seiva obscura dos sulfatos
abolem significados vazios.
Ruínas ressoam, lumes se extinguem
luzes oblongas (dos poros anoitecendo)
poros que tremulam cabem no poema
enquanto arqueologias sonham
com fêmures enterrados em setembro
nas covas do poema.


COMENTÁRIOS
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1. POESIA PARA CAUSAR EFEITOS E SENSAÇÕES
Emylayny Sarayna dos S. F. Filho/ IV Período de Letras/FAMASUL

Para Vital Corrêa, a poesia não necessita de razão e lógica, pois não é feita para ser entendida. Logo, não é necessário usar o significado e sim o significante, utilizado-se de jogo de palavras que vem do inconsciente da pessoa que escreve. A poesia é construída para causar efeitos e diversas sensações, e inspiração e tema não existem nela, pois o poeta usa de técnicas e imaginação para criar e a poesia vem do conhecimento que cada um possui. O escritor é totalmente contrário ao uso da rima no poema, pois ela condena o poema e não o salva. Desse poeta, é o que se pode dizer de um escritor modernista, por valorizar os versos e ritmos livres, aplicação de palavras com ousadias e empregadas de maneira não tradicional, com desapego da lógica.



2. SE A POESIA NÃO TEM SENTIMENTO, O QUE HÁ NA POESIA?
Marinês Alves de Souza/ IV Período de Letras/FAMASUL

 
 
Para Vital Correia a poesia não tem sentimento, ele expressa isso ao dizer que “Quando há sentimento não há poesia, o sentimento não tem nada haver com poesia, o sentimento faz a mão tremer e bloquear a ação do poeta.” Com esta palavra, Vital nos deixou no instante intrigados. Se na poesia não existe sentimento, o que há na poesia? Durante minha trajetória escolar, aprendi que a poesia estava em toda parte: Nas canções de ninar, nas cantigas de roda, nas quadrinhas populares, nas letras das músicas, nos livros (...). Dentre várias definições que conceituavam a poesia, o poeta francês Mallarmé, que define como: “A suprema forma de beleza,” o americano Edgar Allan Poe: “É a criação rítmica de beleza.”
No entanto, assim como Vital, Ricardo Cassiano Monize diz: “Pouco importa, contudo o que importa literalmente é que ela encontre seu núcleo no poema e seja indefinível, porém definidora.” Mesmo assim,  Vital Corrêa afirma que o pensamento atrapalha a poesia. A poesia é um jogo, este que, se decifrado, não é um jogo muito menos poesia. E adiantou: “Não devemos perder tempo com poesias banais, pois estas fazem o nosso psíquico diminuir gradativamente. É preciso o complicado, o não entendimento para que se tenha uma poesia precisa e de difícil acesso, afinal é por meio dela que nosso raciocínio se eleva e nos tornamos mais críticos diante  das circunstâncias do meio acadêmico.”
Em contrapartida as concepções de Vital. O que poderia ser a Poesia? Um recurso textual que se constrói através de ideias, sentimentos, versos e em seus recursos musicais? Ou uma poesia complexa, onde a leitor se faz ‘’obrigado ‘’a pensar e não o poeta pensar por ele. A temática referente aos esclarecimentos perante a combinação dos versos X poemas X estrutura, pôs-nos a entender por que Vital abordou Augusto dos Anjos, de onde utiliza poemas estranhos de toda a nossa literatura, assim como as definições acerca da poesia complexa por Vital (2012): “A poesia complexa desenvolve os neurônios”.
Os questionamentos diante da suposta situação me fazem perceber que a poesia não usa significado, mas significante, por isso o não entendimento.


3. POESIA NÃO NECESSITA DE MÉTRICA, PRECISA DE OUSADIA
Mariana Machado de Lima/ IV Período de Letras/FAMASUL

            O Professor Vital relata que para ele a poesia é feita de “significantes e não de significados”, como na poesia de outros autores. Ele fala que faz poesia para o deleite, tudo isso com um único objetivo: que o público sinta-se dentro de um cenário antagônico, que lhe permita pensar, pois quando se consegue desvendar o significado da poesia deixa de ser insinuante e que o importante é ler coisas instigantes que nos conduzam a transcender o real, o que está posto diante de nossos olhos, o conformismo que para nós literatura e poesia são a mesma coisa, com Vital surpreendentemente torna-se sem efeito Começamos a perceber que tudo o que se poderia esperar dentro de métricas não tem mais significado, “a poesia não necessita de rimas”, de combinação de palavras, precisa de sentimento, de ousadia, imaginação, criatividade para que encontre cumplicidade com aquele que a está recebendo. A primeira vista, o que poderia até nos parecer fora de foco e desprovido de lógica, passa a ter sentido. Vital Corrêa de Araújo é realmente uma mente privilegiada, com um talento que conduz a quem lhe escuta a outro nível, com uma visão diferenciada, defende de maneira veemente seu ponto de vista, que nos faz rever os nossos próprios.


4. A POESIA NO COTIDIANO
Shirlene Priscila de Mélo Correia/ IV Período de Letras/FAMASUL

                Vital Corrêa, grande poeta pernambucano, deu início a palestra perguntando o que é poesia. E em seguida respondeu que não tem definição objetiva e que para ele é realidade, onde se pode expressar melhor a vida.  Vital considera-se um poeta seco, pois quando sente emoção não consegue escrever. Ele disse que sentimento não tem nada a ver com poesia. E afirmou que muitos leitores reclamam porque não conseguem entender algumas poesias, e comenta que poesias não são feitas para os leitores entenderem, pois a poesia é formada pelo significante e não contém significado.
            A palestra com Vital foi muito interessante, pois ele mostrou a importância da poesia no cotidiano da vida, a maneira de expressar quando fala de escrever. Quando fala de poesia é muito bonito. Enfim, ele fala com entusiasmo fazendo com que as pessoas se sintam curiosas e comecem a ler e escrever poesias.


5. A POESIA E AS IDEIAS INTANGÍVEIS
Nailza Maria da Silva/ IV Período de Letras/FAMASUL

O poeta Vital Correia diz que “escreve de uma forma arrebicada, e que não é para se entender e muito menos para sentir.” Pois,  defende que a poesia é o reino indizível. Por esse motivo, não pode ser entendida pelos escassos conceitos seculares. Sua poética é de natureza fechada e dificílima compreensão. Ela expressa às ideias intangíveis, que não podem ser compreendidas pela lógica tradicional, pois está além da compreensão. Vital também ressalta “que a poesia precisa sair da literatura. A poesia é importante, o resto é literatura”. Foi curioso e muito importante conhecer um pouco mais de sua poesia.


6. NORMALIDADE É A PIOR COISA QUE TEM NO MUNDO
Jarian Amélia/ IV Período de Letras/FAMASUL

Vital Corrêa de Araújo afirma que “A normalidade é a pior coisa que tem no mundo. Devemos sair dela”. Sabemos que norma quer dizer regra, e normal já é uma coisa que se espera e nos dá uma ideia de cópia, porque tudo que é normal, termina ficando igual a tudo e a todos. Entende-se que devemos mudar, modificar, reproduzir e não copiar. Desta forma, não estamos seguindo uma regra e é justamente isso que ele propõe. O poeta diz também que, “O pensamento atrapalha a poesia, a poesia é um jogo, devemos tirar todo pensamento.” Isso mostra que a poesia não tem nada a ver com o pensamento, a poesia são os versos escritos sem um conteúdo elaborado. Assim, não é preciso se fazer um estudo de combinação de palavras, não é preciso organizar, e nem elaborar pensamentos para formar a poesia, a poesia é um jogo de palavras. Vital mostrou uma maneira diferente, um lado ainda não despertado quando fala do pensamento, da poesia e da normalidade.


7. AUGUSTO DOS ANJOS VISTO POR VITAL CORRÊA
Cícera Williana Queiroz Pereira/ IV Período de Letras/FAMASUL

O professor, escritor e poeta pernambucano Vital Corrêa de Araújo, falou em sua palestra sobre os cem anos de publicação do livro de poemas “Eu” de Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos, poeta parnasiano simbolista, denominado “Um Anjo Triste”, que se inspirava com as coisas mais insólitas. Vital defende que “a poesia não é para dar o ensino moral, não é para dar recado, não é para explicar coisas, não é para dizer o que a massa faz” – e continua - “a poesia é feita de significantes e não de significados” Comparando-se, por exemplo, ao que pregam certas doutrinas cristãs, que se observa e segue-se ao pé da letra o que está escrito, a doutrina poética não se prende ao que está posto no papel (significado), mas, sobretudo ao que a imaginação e a criatividade nos levam a crer (significante). Neste sentido, Augusto dos Anjos era um mestre, imortalizado pelos seus pensamentos à frente de seu tempo.


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3 comentários:

  1. Só um detalhe: A palestra sobre Augusto dos Anjos não foi promovida pela Famasul, mas sim, por mim, Cícero que, para dá um brilho especial ao evento, convidei o poeta Vital para palestra sobre a vida e a obra do Augusto Poeta.

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  2. Visto por Gleidistone

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  3. Encontrei este cantinho casualmente. Feliz encontro. Saudade da FAMASUL. Abraço, professor. :)

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