29 de maio de 2016

POR FALAR EM SAUDADE

Admmauro Gommes - contracapa de A solidão foi embora (1987)

por Admmauro Gommes, poeta, professor de teoria literária admmaurogommes@hotmail.com

“E por falar em saudade, onde anda você?” Do início da letra desta canção de Toquinho, Vinicius de Moraes e Hermano Silva até chegar em “Quando eu me chamar saudade...” verso de Guilherme de Brito e Nelson Cavaquinho, imortalizado por Nelson Gonçalves, o nosso cancioneiro popular está cheio de um sentimentalismo saudosista. Na verdade, todo mundo sente saudade, em algum momento da vida. Quem já não se surpreendeu cantarolando “Saudade, palavra triste quando se perde um grande amor...” (Meu primeiro amor de Hermínio Gimenez) tantas vezes regravada por grandes intérpretes da MPB?
Mas, de onde vem mesmo a palavra saudade? Dizem que é uma invenção da língua portuguesa ou, para os mais ufanistas, originária do Brasil. É que a nossa exaltação à Pátria exagera-se pra lá das contas! Já ouviu alguém dizer que Deus é brasileiro? Pois bem! Até o Papa Francisco, em conversa descontraída com jornalistas no Rio de Janeiro, brincou, ao demonstrar conhecer o referido dito: “Se Deus é brasileiro, pelo menos que o Papa seja argentino!” O nosso exagero eleva-nos à condição de maiores em tudo, até de criar a palavra que define a lembrança da ausência. Os negros africanos, arrancados à força de sua terra natal, sentiam uma ‘coisa’ chamada de banzo, espécie de nostalgia mortal. Traduzindo: uma saudade extrema. 
Porém, para não ficar no disse-me-disse, sobre a fonte da saudade, recentemente, a professora e pesquisadora Edilene Almeida, da Famasul, conseguiu encontrar resposta para esta questão. Segundo ela, “Saudade não tem origem brasileira.” Em sua pesquisa, confirmou, ainda, que a palavra vem do latim, de solicitude, até se transformar em saudade." Eis a sua explicação: "Veja o processo de modificação do latim ao português: Solitude – inis: solidão pela falta de algo; Solitas – atis: vazio de não ter, isolamento, solidão. Do latim clássico ao latim vulgar houve essas transformações: Solitas –atis > solitate > soledade > soedade > soidade > saudade.”
Explica detalhadamente a douta professora que “Se a vogal intertônica era e precedida de l, o l caiu no latim vulgar tardio ou no período primitivo do português, como: soletatem > soidade, gerando no latim vulgar saydade, suidade, soidade, soedade, sodade e no português padrão saudade – lembrança de algo que não mais se tem.” (A Origem da palavra "Saudade” (www.famasul.edu.br - 06/05/2016).
Destarte, a ‘solitude’ está tão impregnada em nossa memória que os versos de Casimiro de Abreu parecem gravados em cada um de nós: “Oh! que saudades que tenho/ Da aurora da minha vida/ Da minha infância querida/ Que os anos não trazem mais!” Como definiu a mestra, “lembrança de algo que não mais se tem.” De uma forma mais estranha, considerou Chico Buarque: “Leva o vulto teu/ ... é o revés de um parto/ ...saudade é arrumar o quarto/ Do filho que já morreu.” Antes, Chico compreende que “É pior do que o esquecimento.” Em síntese, é o que fica do que passou.


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