28 de junho de 2017

A ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS

Admmauro Gommes
Escritor, palestrante e professor de Teoria Literária
da FAMASUL/Palmares (PE)
admmaurogommes@hotmail.com

Recentemente, a pedagogia tem recomendado a contação de histórias para crianças como algo que incentiva a imaginação e desperta a criatividade. Defende, portanto, que ao estimular as funções cognitivas, a aprendizagem acontece com mais naturalidade, quando esse recurso é empregado. 
Diremos pois, que nem só as crianças se encantam ao ouvir uma bela narrativa e se envolvem com as peripécias do herói. Os adultos também. Basta encontrar alguém que leve jeito em discorrer sobre um fato curioso que a atenção é presa pela habilidade do narrador. A forma descontraída de narrar nos convence, ainda mais quando estamos diante de um habilidoso e envolvente conversador. 
Com tantos meios atuais de que dispõem as práticas educacionais, o velho método de contar uma boa história continua fascinando a todos. Mas é bom que se diga que ler um texto é uma coisa. Ouvir o autor declinar o mesmo episódio, ali na bucha, é outra coisa. São modos diferentes de narrar. A escrita tem seus pontos positivos: parte de uma cuidadosa seleção vocabular, além de revisão gramatical e da busca pelo aprimoramento de um estilo literário. Portanto, diante da voz do escritor, vendo seus gestos, olho no olho, é como se nós estivéssemos dentro da cena, vivenciando o enredo ao lado das personagens. A recepção, pela oralidade, nos fascina de tal modo que tudo que se encontra a nossa volta, alheia ao relato, passa despercebido. O próprio autor quando expõe o que antes escrevera, impõe um caráter dramático aos episódios. Isso é impressionante. 
Constatei essas evidências depois que li a obra “Somente a verdade” de José Paulo Cavalcanti Filho, e tive a oportunidade de conversar com o autor. Foi um momento empolgante ter o narrado em primeira mão, por uma ocular testemunha. Assim, cenários e demais caracterizações passam a ser familiares pela proximidade com quem relata.
Quanto ao livro, seu texto é muito bom. Vem da lavra de quem escreveu mais de mil e quinhentas crônicas. Um veterano contador de ‘causos.’ Enquanto acendia um charuto e jogava a espiral de fumaça para o ar, José Paulo inclinava a cabeça para trás, vendo a nuvem que se formava sob sua cabeça. Naquele enlevo, a memória era acionada, como se abrissem arquivos e mais arquivos entrelaçados pela lembrança. Pronto. No desfazer da fumaça, vinha uma história atrás da outra.

Tudo nos mínimos detalhes. Era a visão de quem lá esteve, destacando a ambientação com extraordinário domínio. Por isso, contava com propriedade o que presenciou. Bem mais que verossímil, afirmava que os fatos eram verdadeiros. E eram mesmo. Usava uma gama de recursos linguísticos e extralinguísticos para que se tornasse o mais real possível, do jeitinho como a coisa se deu. Narrativas assim, ficam na mente do ouvinte e não se dissolvem por muito tempo pois as imagens bem elaboradas permanecem impregnadas na memória. Nem mesmo a fumaça se esvai. 



27 de junho de 2017

COMENTANDO O REALISMO

LITERATURA BRASILEIRA II
Considerando o racionalismo realista como reação ao sentimentalismo romântico, explique a propositura seguinte, baseada no pensamento de Eça de Queirós:

“O Romantismo era a apoteose do sentimento; o Realismo é a anatomia do caráter.”



6 de junho de 2017

SER DIFERENTE NÃO É NORMAL


Admmauro Gommes
Poeta, cronista e professor de Teoria Literária
admmaurogommes@hotmail.com

Existe uma confusão muito grande quando se trata de classificar e entender o que está além da curva e das rotas normais da tradição. Na maioria das vezes, rotulam-se novos comportamentos com discriminação. Este modo torto de ver o mundo representa um olhar distorcido e arcaico e deve ser rejeitado em qualquer instância, modo e lugar.
Não é por ser diferente que alguém é inferior, tampouco superior a nada, apenas pela diferença. O teólogo Bartolomeu Antônio, de Xexéu, lembrou-me esta semana uma frase de Clarice Lispector, da obra “Um sopro de vida,” que diz: “O que me mata é o cotidiano. Eu queria só exceções” É que a exceção é peça extraordinária e atraente. A rotina mata qualquer um de tédio. A regra é comum, geral; o segredo está nas exceções. É por este motivo que os artistas inventam seus mundos, não raras vezes carregados de esquisitices, mas nem por isso são bons ou maus. Apenas inusitados, indicando a marca de determinados estratos sociais ou individuais. Ser diferente não é tão normal, como dizem, e pode ser alvo de exclusão ou privilégio. Depende muito do momento histórico em que se vive, como nos tantos casos de pequenos grupos religiosos, artísticos ou políticos. Acontece que os mesmos perseguidos podem ser transformados em heróis, tempos depois.
Destarte, tudo que foge do comum, do padrão, deve ser observado com expectativa pois está próximo do atrativo (ou da repulsa, que é o avesso da atração). Afasto aqui qualquer julgamento moral e direciono a discussão para o plano estilístico e/ou estético. O que se reveste de espanto muda o rumo das coisas e provoca alterações inevitáveis em uma sociedade que sofre constantes mutações.
O outro, por não ser uma cópia nossa, causa estranheza. Esta situação se percebe quando alguém anda em descompasso com a maioria. É o caso de Vênus, um planeta que não gira no sentido horário, igualmente aos demais. Isso tem me inquietado muito! Como é que um planeta se “revolta” contra seus pares? Mas é algo excepcional e a ciência ainda não explicou. Nem ela nem Freud. Aliás, o que o Pai da Psicanálise explicou minuciosamente foi a condição de o estranho ter sido parte deslocada de nós mesmos, bem familiar em outro tempo, na infância, talvez. (Artigo “O Estranho” - 1919) Seria assombrar-se com a própria sombra ou o fato de Narciso achar feio o que não é espelho?
Normal é fato comum. Os diferentes nos são estranhos e por não entendê-los, quase sempre os rejeitamos. Isso é que não é (e não pode ser), normal. Anormal é não reconhecer com igualdade que os outros têm o direito de ser diferentes.